domingo, 30 de junho de 2013

100. Oumou Sangare (Mali) / Cantigas de Santa Maria (Séc. XIII)



Encantos da Alma  (30/06/2013)

1ª hora: Oumou Sangare (Mali)
“Nascida em Bamako, em 1969, Oumou Sangare começou por acompanhar a mãe, desde os cinco anos de idade, a cantar nas cerimónias de batismo e casamento. No entanto, rapidamente seguiu o seu próprio caminho e, com 21 anos, tornou-se na primeira grande embaixadora da música do Mali, particularmente da região Wassoulou, no sul do país, onde predomina um estilo musical próprio e distinto do universo dos griots.
“Sangare Kono”, a voz de pássaro, uma das mais espantosas do mundo, decidiu cantar para comentar sobre todos os aspetos da vida no seu país, sobretudo os problemas sociais que as mulheres enfrentam diariamente, mas também a sensualidade do amor inexperiente, a dor do exílio, a necessidade de cultivar a terra e a fragilidade da vida humana. Poligamia, arranjo de casamentos, compra de noivas e excisão são alguns dos assuntos tabus abordados por Sangare nas suas canções, dominadas por temáticas universais como o amor, a morte, o destino, o respeito recíproco, a igualdade, a esperança, a harmonia e o divertimento.
Oumou Sangare editou, até à data, cinco registos, todos eles para a etiqueta britânica World Circuit: Moussolou (Mulheres), em 1990; Ko Sira, em 1993; Worotan, em 1996; o duplo Oumou, em 2003, um álbum que recupera os 12 melhores temas dos três registos anteriores e que inclui, ainda, 8 temas nunca antes editados em CD (nomeadamente 6 faixas da bem sucedida cassete Laban, apenas disponível no Mali); e Seya (Divertimento), em 2009, que levou entre dois a três anos a ser preparado, em virtude da diva do Mali ter decidido escolher cuidadosamente as letras e as melodias, de forma a resultarem sedutoras, vibrantes e poderosas.”
(02) N'Guatu (5:18) Worotan
(06) Ah Ndiya (4:29) Moussolou
(10) Mogo Kele (5:40) Seya
(02) Sigi Kuruni (6:09) Ko Sira

2ª hora: Cantigas de Santa Maria (Séc. XIII)
“A designação cantiga foi vulgarmente utilizada nos reinos castelhano e português, até meados do século XV, para se referir, na língua galaico-portuguesa, a uma composição poético-musical sagrada ou profana. De um total de aproximadamente duas mil cantigas galaico-portuguesas da Baixa Idade Média, existentes em vários cancioneiros, infelizmente apenas se conservaram com música as seis obras atribuídas ao jogral de Vigo, Martin Codax e as pertencentes ao fabuloso espólio conhecido por Cantigas de Santa Maria, que, com os preciosos códices nos quais estão conservadas, constituem indubitavelmente um dos maiores monumentos da música europeia de todos os tempos.
A coleção de Cantigas de Santa Maria abarca 426 obras dedicadas à Virgem, compostas na segunda metade do século XIII, por volta de 1250-80, sob a direção do então rei de Castela, Afonso X, el sábio (1221-1284). Pela sua coerência temática e formal, pela sua homogeneidade estilística, pelo seu número e até pela beleza dos próprios manuscritos que as contêm (alguns deles com luxuosas miniaturas), esta coleção tornou-se num fenómeno particular na história da música medieval e constitui o cancioneiro com mais variedade de temas acerca da Virgem Maria em toda a Europa.
Vários são os músicos e ensembles que se têm debruçado sobre as Cantigas de Santa Maria, alguns com excelentes abordagens. Theatrum Instrumentorum, The Renaissance Players, Clemencic Consort, Sequentia, Grupo Sema, Malandança, Jordi Savall, Alla Francesca, Esther Lamandier, Joel Cohen, Antequera, Ensemble Gilles Binchois, Obsidienne, Ensemble Unicorn e Eduardo Paniagua, entre outros, alguns deles aqui destacados, dedicaram pelo menos um registo das suas discografias a este monumento medieval. Os textos poéticos, a música e as imagens dos preciosíssimos manuscritos iluminados, nos quais foram transcritos os louvores à Virgem Maria, os seus milagres e trechos de história sacra chegam, assim, até nós, elucidando-nos sobre a cultura e a sensibilidade do homem medieval.”
(1) Irfan (Bulgária) (9) Santa Maria (4:45)Irfan
(2) Constantinople (Irão/Canadá) (11) Peroque seja a gente, Virgen Madre (7:06) “Carrefour de la Méditerranée”
(3) Jaramar (México) (4) Muito devemos varoes (3:21)Lenguas

domingo, 23 de junho de 2013

99. Orchestra Baobab (Senegal) / Ora Sittner (Israel)



Encantos da Alma  (23/06/2013)

1ª hora: Orchestra Baobab (Senegal)
Orchestra Baobab é uma banda do Senegal, fundada em 1970 pelos patrões de uma discoteca chique de Dakar. O nome do grupo advém do baobab (baobá ou embondeiro, em português), árvore de grande porte, que pode atingir 25 metros de altura e 10 de diâmetro e cuja longevidade chega a ultrapassar um milénio e que é o símbolo do Senegal. A banda, que reunia malianos, senegaleses, togoleses, filhos de marroquinos ou guineenses, produziu uma música que cruzava várias línguas e que fundia harmoniosamente o highlife ganês e nigeriano, as melodias wolof e as baladas da Guiné, os ritmos luxuriantes e incessantes da região de Casamansa e o son cubano, que era, na época, a grande sensação de Dakar.
Em 1987, a Orchestra Baobab, ultrapassada pelos acontecimentos, deu por terminada a sua existência. A Star Band, que estivera na génese da sua formação, fora regenerada e os seus membros mais jovens, incluindo a futura estrela Youssou N’Dour, saíram para fundar um novo grupo, os Étoile de Dakar, e um novo estilo, o mbalax, mais agressivamente ritmado e que rapidamente se transformou no preferido da juventude senegalesa. De repente, a Orchestra Baobab parecia velha e anacrónica. Os seus músicos, porém, recusaram forçar a modernização e seguir a moda, para proteger a sua identidade.
Em 1989, porém, a World Circuit resolveu editar “Pirates Choice”, álbum de 1982 e a Orchestra Baobab começou a ser conhecida no Ocidente. Em 2001, a editora inglesa reeditou o álbum, com canções extra e o sucesso foi tal que a banda, separada há década e meia, recebeu um convite para atuar no Barbican, em Londres. Daí para cá, correram o mundo em digressão e editaram dois álbuns, “Specialist in All Styles” (2002) e produzido, curiosamente, por Youssou N’Dour e “Made in Dakar” (2007). O mbalax passou à história e a Orchestra Baobab mantém-se firme, tão ricamente lúdica, fascinante e elegante como sempre.”
(01) Utru horas (8:39) Pirates Choice
(05) Cabral (4:32) Made in Dakar
(01) Pape Ndiaye (3:41) Made in Dakar

2ª hora: Ora Sittner (Israel)
Ora Sittner, natural de Israel, recupera os cantos hebraicos antigos, que a acompanharam na infância e que, nessa altura, ensinavam as gerações jovens a amar a terra israelita. O que faz Ora Sittner é o que se considera uma releitura da tradição hebraica ancestral, através do canto, de uma voz intimista, que progride como se cantada para subsistir sem acompanhamento instrumental.
Da discografia de Ora Sittner fazem parte álbuns comos “Mostly Love" (1993), “A Nigun Vos Loift Mir Noch” (1993), ”Sacha Argov and Ora Sittner” (1994), “Sings Sacha Argov” (2005), “Songs of Israel” (2006), mas é “Lamidbar: Hebrew Songs from Israel and the Orient” (Al Sur, 1995), em parceria com Youval Micenmacher que nos merece a atenção e o destaque. A voz hipnótica de Ora Sittner e os batimentos de Youval no tof, zarb, daf, bendir, jarre, etc. seguem o seu caminho como se fossem criados para se bastarem a si próprios. As palavras são em hebraico e a música é a dos judeus que viviam nos países muçulmanos do Médio Oriente nos séculos antes da fundação de Israel. Mesmo as canções de há 600 ou 700 anos atrás soam simples e atuais. Nada de pretensiosismos, nem de precauções; apenas cantos e percussões solitárias, apenas música antiga e world music anti-folclórica, despojada, fascinante…
De um imenso repertório, Ora Sittner e Youval Micenmacher escolheram cantos pastoris, como “Lamidbar”, um tema dos anos 30, onde a voz pura e a percussão áspera soam sem artificialismos, com uma ternura rude e simples. Escolheram, ainda, os cantos yemenitas, como “Mahamad Lévavi”, “Dror Iqra” e “Orkha Bamidbar”, canções brilhantes onde Sittner e Youval misturam enredos e sons dissonantes e expõem, pela força da sobriedade, um Oriente profundo, refinado e sem efeitos, onde a percussão soa como um eco da voz. Escolheram, também, os Piyoutim, os poemas sagrados, que contam a extrema beleza, a exaltação e a imensidão do amor de Deus, como é o caso de “Qyria Yéféfyia”, uma canção do século XVI, com texto de um poeta místico de Israel.”
(16) Mahamad Lévavi (3:32)
(04) Lamidbar (3:58)
(18) Dror Iqra (2:47)
(01) Qyria Yéféfyia (4:00)
(19) Orkha Bamidbar (3:59)

domingo, 16 de junho de 2013

98. Dona Dumitru Siminica (Roménia) / Calamus (Espanha)



Encantos da Alma  (16/06/2013)
 1ª hora: Dona Dumitru Siminica (Roménia)
Dona Dumitru Siminica (1926-1979) nasceu em Targoviste, uma fortaleza provincial lautari não muito longe de Bucareste, na Roménia. Nos anos 30, rumou à capital, com a família, atraídos pelo boom da construção entre as duas grandes guerras. O pai de Siminica trabalhou na construção civil durante o dia e tocava o seu violino à noite nos restaurantes suburbanos de Herestrau e Floreasca. Naquela época, a família Siminica viveu no mesmo estaleiro que os irmãos Gore, com quem mais tarde Dona Dumitru Siminica atuaria em festas de casamentos. O jovem cigano herdou tanto o talento do seu pai como o gosto por tocar violino. Trabalhando como pedreiro, passou uma longa temporada a trabalhar como manager, cantor e violinista, antes de se estabelecer como um freelancer no cenário musical em 1962.
Quando Dona Dumitru Siminica cantava "cantece de pahar" (canções de beber), "cantece de jale" (lamentos) ou "cantece de dragoste" (canções de amor) no jardim do café "La Chirigiu", em Bucareste ou no luxuoso restaurante Opera, os clientes ocupavam as mesas tão rapidamente quanto os copos se enchiam de Tuica ou de vinho. Para Dona Dumitru Siminica cantar blues romenos dos subúrbios da capital, delicadamente ornamentados com melodias lentas e hipnóticas, entre a tristeza e o trance, era uma verdadeira paixão. Canções que ofereciam consolo para a solidão e que cuidavam das desilusões dos apaixonados eram muito apreciadas pela audiência. A voz dramática de falsete de Dona Dumitru Siminica raramente conseguia cantar alegres melodias de dança.
Dona Dumitru Siminica editou para a Electrecord romena dois singles, sete EPs, dois LPs e quatro CDs, estes últimos após a sua morte, com repertório editado em vida; em 2006, a Asphalt Tango Records editou a antologia “Sounds from a bygone age - vol. 3”, dando a conhecer ao ocidente uma das mais fascinantes vozes da Roménia e da world music.”
(03) Mosule te-as întreba (7:25) “Mosule te-as întreba”
(01) Cine are fată mare (6:37) “Cine are fată mare”
(01) Inel, inel de aur (6:03) “Inel, inel de aur”

2ª hora: Calamus (Espanha)
“Na ficha técnica do grupo Calamus, de Espanha, encontramos os nomes de Eduardo e Carlos Paniagua, que nos reenviam para outro ensemble que fez história nos domínios da música antiga, os Atrium Musicae de Madrid. Luís Delgado, geralmente presente em projetos de música de fusão, é outro dos elementos dos Calamus, cuja formação se completa com as duas cantoras, Begoña Olavide, já aqui destacada, e Rosa Olavide.
Os cinco elementos que compõem os Calamus, todos eles multi-instrumentistas, usam uma parafernália de instrumentos onde, para além dos caraterísticos oud, târ, qanun, darbuka e guimbri, tocam outros mais exóticos e com nomes mais estranhos como chabbaba, doira, caraqebs e t’ábila. Juntam-se a estes, a flauta, o saltério, a cítola, a viola de arco e o órgão portátil e ficamos com uma ideia da riqueza tímbrica que os Calamus têm à sua disposição.
Os Calamus editaram apenas três registos: Medieval Women’s Songs” (1991), Musica Arabigo-Andaluza/Cantigas de Martin Codax” (1991) eThe Splendour of Al-Andalus” (2008). Imergindo totalmente num som cheio e envolvente, esses discos tanto enquadram as noções mais básicas e enraizadas no inconsciente ocidental da música árabe como as subtilezas de registo e de interpretação, com as quais os Calamus lidam com absoluta competência e agilidade. As vozes das irmãs Olavide optam pelo registo mais etéreo da música antiga, conferindo aos três discos o apelo generalista que poderá conduzir a outro envolvimento e atitude, perante modos mais viscerais de reinvenção deste tipo de repertório.”